Como Escolher Um Livro Em Pouco Tempo…Veja Aqui o Guião De Como o Fazer…

Guião Para Escolher Livros... Fonte: http://www.gersonsouza.com

Hoje e por se assinalar hoje o dia mundial do livro, trago um artigo sobre como escolher bons livros para se comprar, passo a transcrever o referido artigo que saiu no dia de ontem num diário da nossa praça.

«Ler para crer: o segredo para escolher um livro

Na véspera do Dia Mundial do Livro, o nosso crítico literário foi às livrarias testar um simples método de compa: ler uma página ao calhas

Que partes do nosso cérebro se iluminam quando compramos um livro? Comprar livros em anos bissextos reduz a fertilidade? Quais os riscos de comprar um livro e tomar banho meia-hora depois? Este artigo não responde a nenhuma destas questões. Em alternativa, apresentamos um método revolucionário de escolha de livros. Fique connosco.

Os clientes da Amazon estão habituados a receber sugestões com base nas últimas compras, nos títulos que pesquisaram e nos níveis de colesterol. Tentámos perceber como é que as livrarias convencionais respondem ao marketing personalizado. Mas antes de o fazer realizámos uma intensa pesquisa sobre a história deste negócio. Os primeiros vendedores de livros apareceram há milhares de anos em tribos africanas. Enquanto que os seus vizinhos, que se dedicavam à pastorícia ou à agricultura, prosperavam, os vendedores de livros morriam à fome. Os que sobreviveram foram trabalhar em call-centers. As livrarias foram uma invenção mais tardia e surgiram no Antigo Egipto. Os cientistas não sabem se foram criadas por uma inteligência cósmica superior ou por um engenheiro, mas não têm dúvidas de que se tratava de alguém com bons contactos na banca.

Basta entrar numa livraria para perceber que hoje os tempos são outros. Há ar condicionado, música ambiente e, se nos próximos 10 anos o estado da economia melhorar, está prevista a introdução gradual de funcionários simpáticos. A agenda cultural é intensa. Todos os dias há lançamentos de livros, cuja certificação de qualidade depende da presença de um inspector da IGAC e de Pedro Mexia. O marketing pode não ser personalizado mas não faltam vantagens. A Fnac dá descontos, facilidades de pagamento e todos os clientes que atinjam os 200 mil pontos têm direito à vida eterna, com a condição de não comprarem livros no Book Depository durante esse período. Ns Bertrand, assim que entramos, somos abraçados pelo sorriso best-seller de Nora Roberts que promete “Um Sonho de Esperança”. As contracapas berram citações do “The New York Times”, “arrebatadoramente fantástico”, do “Observer”, “fantasticamente arrebatador”, e do “Correio da Manhã”, “filho fantástico congela mãe arrebatadora.” A Fnac tem uns marcadores que dizem “A Escolha do Vendedor” mas que não são muito fiáveis porque eu próprio já coloquei um por cima de uma pilha de livros de Bret Easton Ellis. Durante a minha visita às livrarias observei o comportamento dos potenciais clientes. Pegam no livro, sopesam-no, cheiram-no, encostam o ouvido à lombada (dizem os antigos que desta forma é possível ouvir os sons da floresta cujas árvores foram transformadas naquele livro. Eu experimentei e só ouvi a máquina de café da Fnac) e acidentalmente lêem a badana. Pura perda de tempo. A nossa sugestão é simples: pegue num livro qualquer, abra numa página ao calhas e leia-a. Nós comprovámos a eficácia deste método. Veja aqui em baixo.

Wolf Hall
Hilary Mantel, Civilização, p. 457

Catarina, uma senhora com os dedos inchados, confessa ao senhor Cromwell que falhou perante o país dele “que, nesta altura, também já é o meu país.” Como facilmente se depreende trata-se de uma imigrante ilegal que tenta seduzir um inspector do SEF, o senhor Cromwell. “É-me impossível acreditar que durante anos fui uma prostituta.” Não é o que dizem todas? Ainda por cima, Catarina tem uma ligação com um tipo conhecido no submundo do crime como “O Rei”.

Veredicto: Compro. Já tinha saudades de livros sobre prostitutas narrados na terceira pessoa.


Dentes de Leite
Ignacio Martínez de Pisón, p. 132

O mistério da fada dos dentes é um tema recorrente na obra dos grandes escritores. Tolstoi esteve para escrever sobre o assunto mas à última da hora decidiu visitar uns primos e esqueceu-se. Hemingway nunca escreveu sobre a fada dos dentes mas acertou-lhe de raspão durante uma caçada no Quénia. Quando o escritor diz que há um género de mulheres que parece sempre estar a fazer mais do que realmente faz nota-se que enquanto escrevia terá sido interrompido pelo barulho do aspirador.

Veredicto: Não compro. Nem todos os problemas conjugais dão boa literatura.

Rei Artur: O Filho do Dragão
M. K. Hume, Bertrand,
p. 125

Dois homens nus dançam para uma mulher “confortavelmente sentada num trono”. Até aqui tanto pode ser um ritual macabro como uma coreografia de um espectáculo de Madonna. Entretanto, aparece Llanwith, logo seguido de Artorex, que não sabemos se é um guerreiro ou um frasco de loção capilar.  “Segundo julgo, este cavalheiro deve ser o Severinus, que está a imitar Set, o deus egípcio do mundo subterrâneo.” Ainda bem que há romancistas que explicam as coisas como deve ser.

Veredicto: Compro. É preciso saber até onde vai a capacidade humana para inventar nomes ridículos.

Mudar
Pedro Passos Coelho, Quetzal, p. 69

Sabendo que os eleitores estão fartos de os ouvir dizer banalidades, os políticos decidiram escrevê-las. Nesta página, a primeira do capítulo intitulado A Função da Política, Passos Coelho fala da chegada do homem à Lua e de um discurso de Kennedy para destacar “a capacidade e a determinação de ver, apontar e mobilizar para atingir resultados concretos”. Diz também, e aqui assegura a posteridade, que é importante “realizar, mas realizar tendo sempre em vista o benefício dos resultados”.

Veredicto: Não compro. Pedro Passos Coelho pode ter voz de barítono mas escreve em falsete.

Toda uma Vida, Henrique Monteiro, Dom Quixote, p.103

Muito azar. Abrimos na página em que a narradora confessa que a vida sexual dela morreu. Para não desanimar o leitor lúbrico a narradora conta como, através de uma denúncia anónima, descobriu que o marido, Juan Miguel, andava metido com a irmã dela, Pilar. Reconhece que o facto “embora horrível, pode ter ironicamente contribuído para uma melhoria substancial da minha vida”. Caro leitor, se for apanhado na cama com a sua cunhada, diga à sua mulher que está a contribuir ironicamente para o bem estar dela.

Veredicto: Compro. Sem pestanejar. A possibilidade de um ménage a trois com duas irmãs espanholas é autêntico viagra literário.

Os Espaços em Branco
Samantha Harvey, Bertrand, p. 117

Uma das personagens afirma que “tudo o que diz a Bíblia é verdade, à sua maneira.” Bem pode pregar o Papa contra o relativismo que haverá sempre algum escritor pronto para a blasfémia. Depois, a personagem recorda uma semana em que esteve fechada com a família num abrigo antiaéreo: “Começámos a pensar que as orações estavam a tornar-nos imunes. Depois, uma noite, uma bomba rebentou com a porta do nosso abrigo e levou um dos pés do meu pai.” O lado positivo é que, sem orações, o pai provavelmente teria ficado sem pernas.

Veredicto: Não compro. Precisamos de pensamento positivo, do poder da oração e de pessoas que construam bunkers mais seguros.

Como Deus Manda
Niccolò Ammaniti, Bertrand, p. 245

“Danilo vomitara três litros de álcool e emborcara uma cafeteira pequena de café, agora sentia-se um pouco melhor ainda que não pudesse dizer que a bebedeira já passara.” A primeira coisa que pensamos é que Danilo é um estudante na viagem de finalistas em Benidorm. Ou um estudante numa sexta-feira qualquer em Santos. Ou um estudante em qualquer lado. Mas Danilo não é um estudante. Ele bebe porque a filha morreu num acidente.

Veredicto: Não compro. Pensamento positivo e o livro fala de crianças mortas em acidentes rodoviários? Mudando de ideias, vou comprar o livro de Pedro Passos Coelho.»

In: http://www.ionline.pt/conteudo/56364-ler-crer-o-segredo-escolher-um-livro, a 22 de Abril de 2010, em Jornal I

Boas Compras Literárias.

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